Crime verdadeiro



Eu tinha sete anos quando assisti O silêncio dos inocentes. Era o meu primeiro filme “de adulto”. Posso não ter entendido tudo como uma pessoa crescida de verdade, mas naquele momento troquei de vez as belas adormecidas e pequenas sereias pelas Clarice Starlings.


A partir daí, não há nada que me atraia mais do que um bom suspense. Principalmente se nele estiverem envolvidas tramas crimes e investigações. Pode ser no cinema, TV ou literatura (mesmo eu sendo um medroso que, por exemplo, só assiste a filmes que dão medo se tiver alguém em casa e, de preferência, durante o dia claro).


Conforme fui ficando mais velho, esse gênero continuou a me fascinar. E uma ramificação dele me deixa de cabelo em pé: o “crime verdadeiro” ou “true crime”. É só botar um BASEADO EM FATOS REAIS antes dos créditos que eu me escondo debaixo do cobertor cantando Xuxa em voz alta! Quem também curte esse gênero não pode perder The keepers, nova série documental da Netflix.





Dividido em sete partes com pouco mais de uma hora cada uma, o programa se aprofunda em um mistério de quase 50 anos.


Em novembro de 1969, a freira Cathy Cesnik deixou o apartamento em que dividia com outra religiosa para comprar um presente de noivado para a irmã. Ela nunca mais foi vista com vida. Dias depois, o corpo dela foi encontrado em um terreno baldio.


Ao assistir o primeiro episódio, pode até parecer que a solução deste crime pode ser simples. Alguém que estava no lugar errado e na hora errada. Porém, o assassinato de Cathy é o ponto de partida para uma intrincada trama com segredos da igreja, acusações de abuso sexual e teorias secretas. As amigas Gemma Hoskins e Abbie Schaub capitaneiam o time que volta a investigar os mistérios do colégio Archbishop Keough.





The keepers, dirigido por Ryan White, mostra tragédias dolorosas e pessoais, e merece ser assistido justamente pela maturidade da narrativa, mostrada sem pieguices ou recursos que infantilizam o espectador.


Outro ponto que fascina no documentário é a construção dele, semelhante a de uma bem escrita história de ficção – as histórias são explicadas de maneira quase didática, mas com edição intrigante. Ao fim de cada episódio há sempre um gancho para deixar aquele gosto de “quero mais”. Tudo isso pontuado com uma certeira direção musical de Blake Neely.





Mas se prepare. Mesmo para muitos de nós, “especialistas” em crimes, assassinatos e tramas de detetive no mundo da ficção, uma coisa é certa.


Nada é mais assustador do que a vida real.





Aproveitando o ensejo do tema, segue uma pequena listinha com ótimos nomes para quem quiser se aprofundar no gênero “true crime”. Tem documentários, claro, mas também livro, séries e filmes inspiradas por assassinatos reais. Aproveite. E curta tudo de luz acesa.




O silêncio dos inocentes (1991)





Nesta adaptação cinematográfica do livro de Thomas Harris, a jovem agente do FBI Clarice Starling, interpretada por Jodie Foster, é incumbida de entrevistar Hannibal Lecter (Anthony Hopkins), um sádico serial killer canibal.


As conversas têm como objetivo obter mais informações sobre Buffallo Bill, o assassino de mulheres que costuma “esfolar as suas reses”. Este personagem lembra muito uma figura real: Ed Gein, psicopata americano da década de 1950. O rapaz tinha o costume de fazer roupas e artefatos usando pele humana.


O suspense acabaram virando franquia, o que garantiu a sequência, Hannibal, duas prequels, incluindo uma sobre as origens do canibal, e uma série de TV (isso sem contar Caçador de assassinos, produção obscura dos anos 1980 onde Lecter, vivido por Brian Cox, aparece pela primeira vez).







Psicose (1960)





Ed Gein também foi “tema” do mais famoso filme de suspense da história do cinema. O rapaz “transformou-se” em Norman Bates pelas mãos do escritor Robert Bloch e o diretor Alfred Hitchcock escolheu a obra literária para dar uma guinada na carreira. Psicose foi sucesso de bilheteria e ganhou vida longa com sequências não tão brilhantes décadas depois do original, uma dispensável refilmagem em 1998 e, mais recentemente, uma prequel na TV, Bates Motel, essa, sim, que vale a pena ser assistida.







Zodíaco (2007)





San Francisco, a capital hippie da América na década de 1960, mostra seu lado obscuro nesse suspense dirigido por David Fincher. É na cidade californiana que um assassino começa uma jornada de matança e violência. Para se vangloriar de seus crimes e assustar a polícia, ele começa a escrever uma série de cartas para um jornal da cidade.


Nas mensagens, assina como Zodíaco, um dos serial killers mais misteriosos da história criminal americana. Robert Graysmith, ilustrador da gazeta local que recebia as mensagens do psicopata, contou essa história em livro.







Amanda Knox (2016)





Uma bela americana resolve passar uma temporada na Itália para estudar. Os tempos idílicos de descobertas e diversão transformam-se em pesadelo quando ela encontra a companheira de quarto assassinada. Acusada do crime, a jovem é presa e, neste documentário da Netflix, abre o jogo sobre tudo o que passou.







Almas gêmeas (1994)





Na Nova Zelândia da década de 1950, duas adolescentes imaginativas e intensas desenvolvem uma forte amizade. Os pais delas, preocupados com o rumo dessa relação, resolvem intervir na ligação da dupla. É aí que elas deixam de vez o mundo real e partem para um universo paralelo onde um assassinato seria a melhor solução para o impasse.


Dirigido por Peter Jackson bem antes de O senhor dos anéis, o filme é a estreia de Kate Winslet no cinema.







American crime story: The People v. O.J. Simpson (2016)





Poucos anos antes do boom dos reality shows nos EUA, um evento real congelou os americanos em frente à TV em meados da década de 1990: o julgamento de O.J. Simpson. Acusado de assassinar a ex-esposa e um rapaz em um luxuoso bairro de Los Angeles, o esportista e dublê de ator esteve no banco dos réus diante de um país perplexo e dividido.


O produtor Ryan Murphy (American horror story, Feud) escolheu o caso para estrear sua nova antologia inspirada em famosos crimes americanos que ganhou, merecidamente, uma grande leva de prêmios. Créditos também para Jeffrey Tobin, autor do livro que inspirou a temporada televisiva. No ano que vem será a vez de relembrar outro caso emblemático: o assassinato do estilista Gianni Versace.







Making a murderer (2015)





Stephen Avery, morador de uma pequena cidade no interior norte-americano, é condenado por estuprar uma mulher da alta sociedade. Anos depois, com o avanço das técnicas de perícia, incluindo o exame de DNA, ele é inocentado e busca uma compensação do Estado pelas quase duas décadas que passou na cadeia. Só que ele volta para a cadeia, desta vez acusado de assassinato. Esta série documental da Netflix vai fundo no caso em dez episódios.







Serial killers: anatomia do mal





Guia indispensável para quem gosta do assunto. Com edição caprichada, da sempre competente DarkSide Books, a obra é um compêndio completo sobre o tema. Harold Schechter conta as histórias mais cabeludas, curiosas, desde a idade da pedra, passando por Jack, o Estripador, e chegando até outros nomes, famosos e anônimos. Meu único conselho é ler com reservas. É difícil não se chocar com tamanha violência retratada nas páginas deste livro.




Créditos das fotos: Mamamia, IMDb, Rolling Stone, IMP Awards, FreeDVDCover.com, Fanart.tv, Trailer Addict, AdoroCinema e Lojas Americanas.

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