Classificar Björk como uma artista inovadora é, no mínimo, simplista. O mundo da música é testemunha das grandes inovações trazidas por essa islandesa de 53 anos tanto em técnica (Medúlla, por exemplo, um álbum feito apenas com vozes humanas), quanto de formato. Afinal, ela transformou seus videoclipes em peças de arte. Tanto assim que agora eles são até atrações de museu. Na estrada há três anos, depois de passar por vários países, a mostra Björk digital chegou ao Brasil e fica em cartaz até 18 de agosto.
O programa evidencia as experimentações da artista com a realidade virtual. Mas não é só isso. A exposição leva os fãs e curiosos aos recantos mais íntimos dela, já que as atrações principais são os vídeos de Vulnicura, do latim “a cura das feridas”, disco que conta o fim do casamento de Björk e do artista plástico Matthew Barney: as canções abrangem o início, o meio e o fim de todo o processo deste término.
As visitas são guiadas em grupos formados por horário no Museu da Imagem e do Som em São Paulo (melhor comprar o ingresso pela internet antes). Subimos as escadas direto para a primeira sala, dedicada a Stonemilker, expressão que designa algo como “tirar leite de pedra”. É uma das canções escrita antes do divórcio, ainda em tempos de crise. Após as instruções, colocam-se os óculos de realidade virtual e os fones de ouvido. O que se abre à nossa frente impressiona. Björk cantando à sua volta, como ali ela estivesse.
Segue-se o espaço dedicado a Black lake, esta mais dramática do que a anterior, símbolo do processo de rompimento amoroso. Com o apetrecho de VR, assistimos ao vídeo por dois ângulos diferentes, imersos dentro de uma caverna feita por computador. Este mesmo clipe foi exibido em outra mostra sobre a cantora, uma retrospectiva da carreira dela no MoMa, em Nova York, em 2015, a qual eu tive o prazer de visitar. Em uma sala escura, as duas versões de Black lake eram exibidas simultaneamente em telões opostos, deixando os visitantes livres para circular e participar da experiência como lhes era conveniente.
Gravado ao vivo em show no Japão, Quicksand mostra Björk usando máscara feita em impressora 3D. Em seguida, Mouth mantra, também de Vulnicura, trata de outro assunto delicado: a cirurgia feita por ela após a descoberta de nódulo nas cordas vocais. É como entrar dentro da boca da cantora, de onde sai a voz potente e melódica que tanto encanta os fãs.
As últimas experiências são interativas e absolutamente fantásticas. Por meio de artefato que se assemelha a um joystick, costuramos linhas na tela enquanto Family é exibido em espaço separado e menor, quase individual. Por fim, em Notget, assim como na sala de Stonemilker, Björk se apresenta de pertinho, desta vez em versão high-tech, um híbrido gigante de mulher e máquina. Impressionante, só vendo.
O segundo andar reserva ainda espaço onde pode-se usar o app educativo Biophilia, baseado no disco de 2011, usado por escolas escandinavas. Completa a visita um cineminha que exibe os diversos clipes que provam: Björk é uma artista fenomenal. Em todas as dimensões.
Cinco vídeos para conhecer melhor o trabalho da cantora (e algumas historietas pessoais que provavelmente não interessam a ninguém)
Army of me
Post (1995)
Lembro da estreia dele no Vídeo show, vejam só. De cara eu já gostei do som e logo fiquei encantado com a narrativa nonsense do clipe. E também com a genética islandesa, porque lembro do Miguel Falabella contando que já tinha 30 anos apesar da cara de adolescente.
It’s oh so quiet
Post (1995)
Talvez essa seja a música mais mainstream da Björk e o vídeo não foge à regra. Bem americano, mostra a cantora em clima de musical dos anos 1950. Bom pra dar uns gritos dentro de casa (antes das 22h, por favor). Ah, é dirigido pelo Spike Jonze.
Hunter
Homogenic (1997)
Descobri essa faixa na trilha sonora de Arquivo X – O filme. Existe algo mais Björk do que isso?
Pagan poetry
Vespertine (2001)
Após uma intensa “semana do saco cheio” em 2001, voltei para casa 10h no ônibus ouvindo esse disco. O clipe ousado e poético só contribuiu para eu gostar ainda mais do tema em particular.
Declare independence
Volta (2007)
De outra fase mais pop da cantora, em que ela colaborou inclusive com Timbaland, esse tema diz muito sobre hoje, sobre tudo.
Crédito das imagens: Nick Knight e Andrew Thomas Huang.